terça-feira, junho 8
Uma obra feita de coragem
Assim a define o jornalista Expedito Filho nas páginas amarelas da Revista Veja, em matéria que antecipou a publicação de Viagem à Luta Armada no Brasil ano de 1996.
Em Viagem à Luta Armada e Nas trilhas da ALN, publicados respectivamente nos anos de 1996 e 1997, Carlos Eugênio Clemente relata sua experiência político-militar, desde sua participação no movimento estudantil secundarista entre 1966 e 1968, até sua chegada a comandante de uma organização armada, a Ação Libertadora Nacional – ALN.
Sua experiência é uma importante fonte de conhecimento dos mecanismos internos da ALN, sua formação, seus ideais e suas práticas, lançando luz sobre um período pouco conhecido na história do Brasil. Mais em particular, em relação à própria história da Organização, dada à quase inexistência de obras que fazem referência à ALN depois do assassinato de seus fundadores, Carlos Marighella e Joaquim Câmara Ferreira.
Clemente assumiu com 19 anos o comando militar da organização em São Paulo, permanecendo como seu principal comandante até final do ano de 1972 quando, por uma votação realizada na Coordenação Nacional da ALN, foi enviado para Cuba, onde viveu nove meses estudando e aprimorando seus conhecimentos, num curso de Estado Maior oferecido pelo governo cubano. Era a forma de assegurar a sobrevivência daquele que estava em primeiro da lista dos procurados pela repressão política brasileira.
A história de vida de Carlos Eugênio continua motivo de interesse. Entrevista sobre o militante foi publicada pela revista Carta Capital e muitos depoimentos de Carlos Eugênio têm sido utilizados para diversos fins acadêmicos e políticos.
Seus livros inspiraram também documentários e filmes sobre esse período, como o caso da produção de Renato Tapajós e Toni Venturi No olho do Furacão , o filme Cabra-Cega de Toni Venturi, e mais recentemente o documentário Cidadão Boilesen de Chaim Litewski, premiado como melhor documentário brasileiro no Festival É tudo Verdade de 2010, no qual Clemente dá uma entrevista essencial.
Carlos Eugênio Clemente foi o primeiro Ouvidor do Trabalho do Rio de Janeiro (SETRAB) no biênio 2000/ 2002. Participa de fóruns de discussão política promovidos pelo PSB (Partido Socialista Brasileiro) e é figura presente em congressos realizados na temática sobre ditadura militar e memória política do período.
Na entrevista Veja no dia 31 de julho de 1996, sob o título Memória do Terror, Expedito Filho afirmava “o mais curioso personagem da luta armada no Brasil é também o menos estudado (...)”. Expedito Filho destaca a postura rara até o momento, de narrar experiências e assumir responsabilidades. Carlos Eugênio, como poucos, assumiu integralmente sua militância, defendendo a legitimidade de sua luta, e da luta de sua geração em contraposição a muitos, que por motivos vários, tentaram negar essa experiência como um sinal de voluntarismo inconsequente ou colocando-se ao lado de combatentes arrependidos.
Sua luta e a luta de sua geração foi a consequência de uma parte de jovens que optou não por uma morte moral, submetendo-se passivamente, mas daqueles que escolheram outro tipo de morte, aquela que recupera a dignidade do indivíduo, sua liberdade, e acima de tudo, a liberdade de seu povo.
Maria Cláudia Badan Ribeiro
Mestra em Ciências Socias pela UNICAMP
Doutoranda em História pela USP
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